Meu coração está cheio

 

É o amor uma experiência cultural, induzida e socializada especialmente para o gênero feminino? Como reconstruir ou transformar essa prática em outras formas de amar?

“Meu coração está cheio” é um projeto que propõe uma reflexão sobre o amor romântico heterossexual sob a perspectiva das mulheres. 

Através de autorretratos, naturezas mortas, fotos de arquivo e do ambiente doméstico os diferentes estágios da experiência amorosa são simbolizados, indicando uma repetição desses ciclos.

A rotina dos autorretratos surgiu como resposta à indagação de um amigo casado sobre meu estado de ânimo vivendo sozinha nos primeiros meses da pandemia de Covid-19. Com a idéia de solidão implícita nesse questionamento, passei a fotografar meu dia a dia como se estivesse sendo observada por um parceiro imaginário. 

Para expandir o vocabulário de expressões apaixonadas e de reações ao ser fotografada, busquei fotos tomadas por ex-namorados. Incorporei-as ao projeto, tanto como forma de recontextualizar as situações vividas quanto para fazer o paralelo entre meu eu objeto do olhar do outro com meu eu sujeito dos autorretratos.

As imagens do ambiente doméstico se referem à noção proposta por Virginia Woolf do espaço ininterrupto como condição básica para que as mulheres possam se dedicar à escrita ou à arte. Meu espaço figura, então, não apenas como condição para a criação mas também como palco e o próprio objeto da criação. 

 

Durante as leituras de portfólio do Fest Foto 2020, ganhei como prêmio uma exposição individual no CdF – Centro de Fotografía de Montevideo, no Uruguai. “Mi corazón está lleno” ficou exposto na Fotogalería do Parque Capurro de março a junho de 2022.

Para ocupar as estruturas de metal em formato ziguezague existentes no parque, busquei inspiração no biombo. Esse elemento decorativo separa o espaço público do privado no interior de palácios, templos, santuários e casas japonesas. As telas são ornamentadas com temas como a mudança das estações, flores e outros elementos simbólicos – temática comum às naturezas mortas e às fotografias do meu ambiente doméstico ao longo do tempo.

Os biombos são dispostos em pares e a imagem apresentada pode ser fragmentada ou contínua. Ao dividir as fotografias horizontais entre dois painéis, represento a natureza fragmentária e subjetiva do trabalho, deixando a interpretação mais aberta. A edição das imagens foi feita pela curadora francesa Clelia Bailly.